Eu já fiz a resenha de Salem (ou a Hora do Vampiro). Acessem-na aqui (https://casadokhellendros.wordpress.com/2014/12/07/resenha-salem-de-stephen-king/). Leram? Agora vamos conversar sobre esse conto que, na minha opinião, era a intenção original de Stephen King ao escrever o livro.
O conto se passa quase um século antes dos acontecimentos do livro. Charles Bones é um indivíduo respeitável que acabara de chegar ate a modesta cidade de Chapelwaite onde planejara estabelecer moradia. Junto se seu companheiro Calvin McCann estabelece residência em um lugar onde sua família era vista com muito desagrado pela comunidade local. Tudo isso por conta de vários relatos obscuros sobre rituais macabros que ocorriam nas ruínas de uma pequena cidadezinha próxima de Chapelwaite. Adivinharam qual é a cidade? Isso mesmo: Jerusalem’s Lot. Aos poucos Charles Boone, cujo apelido é Bones, começa a investigar a fundo esses relatos de forma a limpar o nome de sua família.
Achei muito interessante a maneira como King acrescentou uma série de detalhes ao mito de Jerusalem’s Lot. Vi em diversos momentos uma inspiração retirada de Robert Chambers e seu Rei Amarelo, ao acrescentar vários elementos mitológicos e de necromancia aos relatos sobre os antepassados de Bones. Toda a história gira em torno do De Vermis Mysteriis, um livro que continha os segredos da imortalidade. Livro esse que daria incríveis poderes ao seu usuário, mas danaria a sua alma.
Existem muitos elementos das histórias góticas do século XIX. Somos capazes de sentir aquele cheiro de Bram Stoker presente nesse conto. Em Salem, King precisou mudar os rumos da história na segunda metade do romance; aqui ele não precisou fazer o mesmo porque a história seria naturalmente menor do que um livro per se. Isso se levarmos em conta que esse conto é o que possui o maior número de páginas na coletânea Sombras da Noite. |
A ambientação me lembrou a Salem dos filmes: moradores desconfiados, pessoas escondendo mistérios do vilarejo. Todo esse ar de mistério e escuridão contribuem para nos fornecer o clima ideal para que King trabalhe nossas sensações. Aliás, esse é um conto que mexe com os nossos sentidos. Não somos capazes de ver a cidade; mas o relato de King é tão vívido que eu sou capaz de imaginar os cheiros e os sons do lugar. Quando Bones e McCann entram na igreja corrompida em Jerusalem’s Lot, tive medo. Pude ouvir os sons dos mortos que ecoavam profanados pelo De Vermis Mysteriis. Quando McCann é arrastado por forças obscuras, senti desespero. Nisso King é muito bem sucedido neste conto. Ele te arrasta indubitavelmente para o relato, trabalha o leitor a cada momento da história.
Os personagens não são tão aprofundados. Não há necessidade. A ideia é de que Bones seja o estranho a chegar no vilarejo e a tentar investigar os estranhos acontecimentos de que sua família é culpada. Os habitantes de Chapelwaite pouco aparecem e nem necessitam tanto. Basta que eles contribuam com a mitologia presente no conto. Eu entendi McCann como sendo um Dr. Watson para um Sherlock Holmes. Um fiel escudeiro que estava ali para ajudar o seu protetor. Uma pessoa comum dotada de bom senso e uma pequena dose de superstição para avisar seu protetor dos possíveis perigos em sua jornada.
O foco realmente estava em Bones. Podemos ver o personagem definhando lentamente ao longo da trama. À medida em que a maldição do livro obscuro o afeta, Bones vai enfraquecendo. Outra inspiração que percebi nesse conto é de Lovecraft: King claramente tirou várias ideias de um famoso conto de Lovecraft chamado A Música de Erich Zann. Neste conto a cada vez que o protagonista ouvia a melodia que ele não sabia de onde era originada, sua alma enfraquecia e cedia espaço para a influência dos Deuses Anciãos. Substitua isso pelos vampiros e seres malditos do livro De Vermis que nos aproximamos de uma inspiração. Aliás, King não esconde o seu apreço por Robert Chambers e H.P. Lovecraft. São sim os maiores escritores de terror do século XIX e influenciaram muito autor do gênero que se preze. |
Boas leituras a todos!!